Os minerais da África estão sendo trocados por segurança — e por que isso é uma má ideia
- Márcia Oliveira
- 29 de jul.
- 2 min de leitura

Em julho de 2025, Hanri Mostert (Universidade da Cidade do Cabo) e Tracy‑Lynn Field (Universidade de Witwatersrand) publicaram um artigo impactante na The Conversation, alertando para o preocupante modelo comercial emergente: a troca de minerais africanos por garantias de segurança periféricas e pouco transparentes.
A troca que preocupa: segurança por minerais
O mais recente tratado de paz intermediado pelos EUA entre República Democrática do Congo (RDC) e Ruanda (assinado em junho de 2025) propõe um arranjo onde a RDC compromete seus recursos minerais — coltan, cobalto, ouro — em troca de promessas vagamente formuladas de segurança proporcionadas por Washington.Embora inclua um comitê de supervisão com a União Africana, Catar e EUA, o documento não estipula obrigações específicas de segurança por parte dos EUA, deixando em aberto o real valor recebido pela RDC em troca de seus recursos.
Por que esse modelo é considerado prejudicial
1. Perda de soberania e poder de barganha
Os autores argumentam que esse tipo de acordo representa uma continuação de modelos coloniais pós‑modernos: estados ricos em minerais cedendo poder estratégico a interesses externos por segurança precária e condições nebulosas.Esses acordos geralmente são menos transparentes e mais complexos do que iniciativas de intercâmbio anteriores, como investimentos em infraestrutura por concessões minerais.
2. Baixo retorno real para os países africanos
Mesmo com potencial de investimento multibilionário, há pouca garantia de que a RDC ou outros beneficiários perceberão benefícios concretos: nem melhorias sociais, nem autonomia econômica.O risco é que tais acordos erosionem a governança local e promovam crises futuras em nome da “segurança” em troca de recursos naturais.
3. Padrões anteriores de exploração e conflito
A exploração de minerais foi historicamente associada a violência e instabilidade na RDC e em Angola. A troca de recursos por segurança repete padrões já observados com países como China e Rússia na África Central e Subsaariana.
Alternativas defensáveis para o uso desses recursos
Mostert e Field defendem que países africanos devem negociar acordos que:
Educação, saúde e infraestrutura sejam prioridades claras;
Operações sejam transparentes e regidas por governança local robusta;
Haja mecanismos que assegurem retorno econômico direto e sustentável às comunidades;
Minerais sejam utilizados para desenvolver cadeias de valor regionais, não para alimentar coopetição internacional.
Conclusão: é hora de reverter esse paradigma
A troca de minerais por promessas tênues de segurança compromete não apenas a soberania africana, mas também o potencial de usar recursos estratégicos como alavanca de prosperidade local.Em vez de conceder soberania em nome da paz, os países africanos deveriam usar o valor de seus minerais para negociar condições sólidas de desenvolvimento, responsabilidade e benefício direto.
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