Lago Natron (Tanzânia): o “lago vermelho” que conserva carcaças e abriga milhões de flamingos
- Márcia Oliveira

- 30 de set.
- 3 min de leitura

Se você já viu fotos de animais “virando pedra” às margens de um lago vermelho na África Oriental, muito provavelmente era o Lago Natron. Ele chama a atenção pelo visual surreal e pela química extrema: trata-se de um lago soda — extremamente alcalino — cuja água pode alcançar pH próximo de 10,5, quase tão cáustico quanto amônia. Ainda assim, é um ecossistema vibrante para microrganismos e o principal berçário do flamingo-menor (Phoeniconaias minor).
Onde fica e por que é tão diferente
O Natron fica no norte da Tanzânia, junto ao Vale do Rift e ao vulcão Ol Doinyo Lengai. A região é árida: em anos sem El Niño, chove menos de 500 mm; a evaporação supera a precipitação, concentrando sais que mantêm o lago raso, quente e muito alcalino. A reposição de água vem sobretudo do rio Ewaso Ng’iro (norte).
Por que o lago fica vermelho?
As cores vermelho-crimsons e alaranjadas aparecem quando a água baixa e a salinidade sobe. Nessa condição, micro-organismos halófilos (como haloarqueias e algumas cianobactérias) prosperam e produzem pigmentos que tingem a lâmina d’água e as crostas salinas nas margens. As imagens de satélite mostram claramente essa paleta mutável, com faixas vermelhas no centro e tons alaranjados nas áreas rasas.
“Petrificação”: mito x realidade
O Natron não transforma animais vivos em pedra. O que ocorre é um processo de preservação/mineralização pós-morte: quando aves ou pequenos mamíferos morrem no ambiente alcalino, sais como carbonatos se depositam, formando crostas e “múmias” rígidas que parecem esculturas. A água cáustica também pode queimar tecidos de organismos não adaptados, mas o efeito de “virar estátua instantaneamente” é um mito popularizado por fotos impactantes.
O maior berçário do flamingo-menor
Paradoxalmente, o que é hostil para muitos animais cria um refúgio para os flamingos-menores. A química do lago afasta predadores e, em anos favoráveis, as colônias constroem ninhais cônicos de “lama-soda” em ilhotas cristalizadas, longe do alcance terrestre. Estimativas indicam que uma parcela gigantesca — frequentemente citada como a maior parte — da população mundial se reproduz no Natron, razão pela qual a área é crítica para a espécie.

Paisagens de satélite e ciência a olho nu
O Natron é um dos “laboratórios naturais” mais fotogênicos vistos do espaço. Sequências da NASA mostram variações sazonais de largura, profundidade (geralmente < 3 m) e tonalidade, além de “jangadas” de crostas brancas nas partes mais rasas. Essas séries ajudam cientistas a relacionar clima regional, aporte de rios e dinâmica de evaporação com a biologia do lago.
Dicas de visita responsável
Quando ir: períodos secos evidenciam as cores e as crostas; porém, o acesso pode ser mais difícil.
Respeite a reprodução: evite áreas de ninhais (normalmente ilhas e bancos centrais). O distúrbio humano pode levar colônias inteiras ao abandono. (Ótimo contratar guias locais.)
Proteção pessoal: a água e as margens podem ser cáusticas; não nade, proteja pele/olhos e use calçados adequados.
Cultura local: o lago está em terras próximas a comunidades Maasai — valorize o turismo que beneficia os moradores.

Curiosidades rápidas
Química extrema: o pH alto resulta do acúmulo de carbonatos e outros sais oriundos da geologia vulcânica do Rift, concentrados pela evaporação.
Cores vivas: haloarqueias e cianobactérias pigmentadas são as artistas por trás do vermelho/laranja vistos do chão e do espaço.
“Estátuas” naturais: carcaças podem ganhar incrustações minerais, conservando-se com aspecto de escultura — impactante, mas não instantâneo.
Berçário vital: a segurança relativa contra predadores torna o Natron indispensável ao ciclo de vida do flamingo-menor.
Fontes:




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